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2021-10-01
Maria Barbosa escreve artigo sobre regras de vacinação de colaboradores

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Trick or Treat? Podem os empregadores portugueses conceder benefícios para os trabalhadores já vacinados contra a Covid-19? | Maria Barbosa, Associada Coordenadora do Departamento de Laboral da CCA

Ultimamente temos sido amiúde confrontados com questões como: Podem os empregadores atribuir benefícios ou outras vantagens aos trabalhadores que já estão inoculados contra a Covid-19? E será que podem exigir aos trabalhadores que apresentem o certificado de vacinação para entrarem no local de trabalho ou até para efeitos de contratação?

A verdade é que a imensa criatividade de algumas empresas além-fronteiras tem inundado os empregadores portugueses, que se questionam se poderão implementar tais medidas, ou outras semelhantes, em Portugal.  

Por exemplo, no banco Morgan Stanley a partir do dia 12 de julho que apenas é permitida a entrada aos trabalhadores que já tenham sido vacinados. No Reino Unido várias empresas estão a incluir uma cláusula de obrigatoriedade de vacinação para a Covid-19 nos respetivos contratos de trabalho.  Nos Estados Unidos, ou mesmo na Alemanha, há empresas que estão a atribuir um subsídio único para promover a vacinação entre os seus trabalhadores. Existem ainda empregadores que pretendem atribuir dias de férias adicionais (entre 3 e 10 dias) aos trabalhadores que forem vacinados.

Será que em Portugal a implementação de políticas de benefícios / vantagens desta natureza seria lícita? A verdade é que as opiniões não são consensuais, mas a nossa opinião é a de que, na grande maioria das vezes, a resposta será negativa, essencialmente pelos seguintes motivos:

O primeiro motivo prende-se com o modo como um determinado empregador conhece se o trabalhador foi, ou não, vacinado. É que, nos termos do Código do Trabalho, o empregador não pode exigir a candidato a emprego ou a trabalhador que realize ou apresente testes ou exames médicos, salvo quando estes tenham por finalidade a proteção do trabalhador ou de terceiros, ou quando particulares exigências inerentes à natureza da atividade profissional o justifiquem e seja fornecida por escrito a respetiva fundamentação. Ou seja, para que o pedido de informação sobre a inoculação seja lícito, é necessário que razões relacionadas com a proteção do trabalhador ou de terceiros, ou com a própria atividade profissional, se sobreponham ao direito do trabalhador de reservar para um âmbito privado informação sobre a sua saúde e sobre os resultados de testes e exames médicos.

Ora, sopesar ambos os direitos é exatamente um dos pontos que mais tem oferecido discórdia. Com efeito, enquanto há quem defenda que o mero facto de estarmos perante uma pandemia justifica a solicitação da informação por tarde dos empregadores; por outro lado, há também quem defenda – posição que sufragamos - que esta solicitação da empresa não poderá ser feita a todo e qualquer trabalhador, sendo essencial aferir se a atividade profissional prestada pelo trabalhador e o local de trabalho podem justificar uma limitação do direito (como, por exemplo, uma enfermeira que presta atividade num lar de idosos ou um médico que trabalha num hospital). Em nossa opinião, como a vacinação não é obrigatória, será sempre necessário fazer uma ponderação de proporcionalidade, para aferir se o direito de reserva do trabalhador se sobrepõe, ou não, a questões de saúde pública, e apenas em casos muitos pontuais será possível exigir aos trabalhadores que disponibilizem informação sobre se já estão ou não vacinados.

O segundo motivo está relacionado com a potencial discriminação entre trabalhadores. Com efeito, ao conferir-se benefícios / vantagens a quem já foi vacinado, poderá estar-se a discriminar quem ainda não o foi, independentemente do respetivo motivo. Do ponto de vista de um trabalhador vacinado será certamente fantástico receber mais dias de férias. Ao invés, aquele trabalhador que não foi vacinado, sentirá certamente que ao não lhe serem concedidos os dias de férias adicionais está a ser castigado. Parece-nos que o risco de se estar perante situações discriminatórios ao aplicar uma política de benefícios / vantagens é elevado e poderá conduzir a um maior desconforto por parte dos trabalhadores não vacinados ou até a um aumento de litigiosidade.

Resta-nos, assim, aguardar se o legislador irá integrar no elenco legal já existente a possibilidade de o empregador requerer o certificado de vacinação como uma medida possível para salvaguardar a saúde e segurança do trabalhador, de terceiros ou da própria atividade.